Segredos das assembleias bem-sucedidas

Preparo prévio, com uma boa parceria síndico/administradora, além de apoio jurídico são pontos importantes para o êxito de uma assembleia condominial

Ofensas verbais, ameaças e até a presença de seguranças para inibir atos violentos. Quem vive o dia a dia dos condomínios, como administradores, síndicos e advogados, sabe que ações como essas não são raras nas assembleias condominiais. E mesmo que a violência não chegue às vias de fato, costuma haver uma certa tensão no ar.

A administradora Sheila Cristina Militão tem 20 anos de experiência em assembleias e percebe que há reuniões onde o condômino vai “armado”, ou seja, pronto para “bater de frente” com a gestão: “Parece que o síndico e a administradora são contra os condôminos.”

Em certos casos há motivos para os moradores serem reativos nas reuniões. Um condomínio na zona leste da capital sofreu um golpe de 900 mil reais do ex-síndico. “Fomos contratados como administradores e um novo síndico orgânico assumiu. Nessa época as assembleias eram terríveis, os moradores estavam traumatizados com o que tinha acontecido e pediam transparência. Criamos barreiras para proteger o patrimônio, ou seja, levamos mais clareza para os processos.” Pagamentos e saldos foram disponibilizados via aplicativo, entre outras iniciativas. A tensão diminuiu e as assembleias ficaram mais calmas. “A transparência tranquilizou a comunidade”, conclui.

Sheila enxerga as assembleias como uma oportunidade de encontro entre síndicos e moradores. “O morador quer saber se o síndico está trabalhando, e é na assembleia que isso acontece”, diz. Também é o momento de colocar em prática a parceria síndico e administradora. “A gestão não é só do síndico, mas também da administradora. Precisamos estar alinhados. Se o síndico falhar na assembleia, eu também estou falhando enquanto administradora”, aponta Sheila, que costuma chegar às assembleias com a “ata pronta”: “Eu sei o que vão perguntar e o que irei responder. Não basta só levar uma ‘cola’, mas muitas vezes responder antes mesmo de perguntarem. Tem administradora que apenas faz a abertura da assembleia e o síndico se vê sozinho no transcorrer da reunião. Na verdade, a assembleia é o momento do show do síndico e da administradora. O síndico precisa estar seguro para vencer a timidez e não travar no momento de um questionamento.”

Por isso, o síndico deve se preparar para a assembleia. Sheila conta que é comum os síndicos terem sintomas de ansiedade na semana que antecede a reunião. Um bom preparo é a melhor receita para vencer o nervosismo, além de agir naturalmente e com cortesia. “Falo para os síndicos: cumprimentem quem está chegando, isso desarma o opositor. Levantem a cabeça, ajeitem a postura, se apresentem. O corpo fala! Brinco que a ‘turma do mal’ chega sempre com um monte de papel embaixo do braço para aterrorizar o gestor. E há síndicos que mal preparam o corpo quanto mais a documentação”, repara a administradora.

ATO JURÍDICO

A advogada Tanila Savoy participa de assembleias condominiais em vários contextos. É síndica orgânica, assessora gestões de síndicos e acompanha suas assembleias, mas também costuma representar algum condômino ou é contratada pontualmente para o que chama de “casos de emergência”: “São assembleias com riscos iminentes de conflitos, quando é previsto que algum item da pauta gere problemas”.

Os conflitos, pontua Tanila, são inerentes à vida em condomínio. “Lidamos com uma comunidade onde as pessoas moram ou trabalham e onde as decisões são compartilhadas. Cada um se sente pertencente àquele lugar e quer ser ouvido. Cabe ao gestor tentar mitigar os conflitos, consertar o que conseguir e explicar o que não dá para ser melhorado naquele momento. Em resumo, entregar uma palavra: eu vou tentar resolver isso. Essa gestão prévia constante do síndico, aliada a um bom zelador, a um prédio que está limpo e com a manutenção em ordem, faz muita diferença no momento da assembleia”, acredita. “Assembleia não é um ato isolado. É um conjunto de atos que reverbera na assembleia”, completa.

Para Tanila, a presença de um advogado na assembleia é fundamental. “O corpo jurídico deve ser um pacificador de conflitos, já que ele tem o conhecimento de como essa assembleia pode e deve ser conduzida. Advogados e advogadas devem chegar em assembleia com o fim de ajustar, de agregar. A assembleia não pode ser um ringue, uma batalha, onde as pessoas vão para brigar. É sua casa, o local que todos querem que esteja limpo, com boa manutenção e seguro”, resume.

Outra figura importante para o bom andamento das assembleias é o presidente da mesa. Tanila explica que quando uma assembleia desanda, ele é quem irá ditar a regra e até mesmo encerrar o encontro se ele considerar que o ambiente não é mais seguro. “Precisamos fazer com que as pessoas agressivas não evoluam nesse ódio, não destilem veneno na assembleia. Aí vem a calma, o jogo de cintura e o conhecimento. A assembleia é um ato jurídico, legal, um ato formal de cumprimento de lei”, explica.

Sheila Cristina Militão - Foto Divulgação
Tanila Savoy - Foto Divulgação

EDITAL DE CONVOCAÇÃO

É preciso dar mais importância para o edital de convocação das assembleias. “Ele é o documento que fará com que a assembleia transcorra bem”, sustenta Tanila Savoy. Alterar a ordem dos itens do edital ou votar temas levantados nos “assuntos gerais” são decisões equivocadas. “Minha orientação é que nem seja colocado o item Assuntos gerais. A assembleia é aberta. Acabados os itens, quem desejar pode falar.”

Outro ponto importante: o quórum necessário para a aprovação de obras. Se há o desejo de, por exemplo, construir uma piscina onde antes era um parquinho ou uma área pouco aproveitada é preciso aprovação de 2/3 dos condôminos. “Oriento os síndicos a irem aos poucos. Não podemos tratar tudo como urgente. Em uma primeira assembleia, coloque na convocação: Informações sobre eventual obra a ser efetuada no condomínio – Piscina. É apenas uma informação de que o síndico está recebendo pedidos para construir uma piscina. Conforme a resposta da assembleia, ele pode levantar orçamentos para a próxima assembleia”, diz a advogada. Fazer enquetes prévias, conversar com os moradores, conhecer sua comunidade e as etapas de uma assembleia, preservar a votação e os quóruns: essas são algumas das lições de casa para o síndico. “Acredito nas assembleias como instrumentos para o gestor trabalhar com segurança”, arremata Tanila.

   BOAS DICAS

  • Realizar assembleias no ambiente digital costuma diminuir conflitos. “Por isso muitos condôminos preferem o palco das reuniões presenciais, ou o palco da discórdia”, pontua a advogada Tanila Savoy. Ela frisa ainda que as assembleias virtuais têm amparo legal (a menos que a convenção as proíbam), mas é preciso conhecer a comunidade de cada condomínio para checar sua viabilidade.

  • Há quem não deixe faltar cafezinho, chá e biscoitos nas assembleias. Porém, de nada adiantam os quitutes se os participantes chegarem na “força do ódio”. Muito preparo, tanto do síndico como da administradora, aliado a bom humor e jogo de cintura ajudam a “quebrar o gelo” e barram a evolução da ira e da impaciência.
  • Na hora de preparar a convocação, é comum o síndico ter receio de colocar itens demais. “Acho que é preferível que a assembleia comece às 20 horas e termine a meia-noite, do que a reunião ser rápida e a discussão continuar no grupo de WhatsApp, com os moradores reclamando que o síndico não colocou aquele esperado assunto em pauta”, resume a administradora Sheila Militão.

Matéria publicada na edição 309 mar/25 da Revista Direcional Condomínios

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Autor

  • Luiza Oliva

    Jornalista com larga experiência em reportagens e edição de revistas segmentadas. Editora do site e Instagram O melhor lugar do mundo, voltado à decoração, arquitetura e design. Editora da Panamby Magazine, publicação dirigida aos moradores do bairro do Panamby, região do Morumbi, em São Paulo. Desde 2005 também atua na área da educação, com publicações especializadas e cursos para formação de professores.